Outubro Rosa: Quando o corpo fala o que a mente silencia
Publicado em 24/10/2025
Outubro chega envolto por um laço cor-de-rosa. As ruas se enchem de empatia, as campanhas florescem e o discurso da prevenção ganha espaço. É um mês que convida ao cuidado, mas também à reflexão. Porque, enquanto o mundo fala sobre o corpo feminino, há algo que ainda permanece nas entrelinhas: o que acontece com a mente das mulheres que precisam ser fortes o tempo todo?
O Outubro Rosa nasceu com a missão de conscientizar sobre o câncer de mama uma doença que, quando identificada precocemente, tem grandes chances de cura. A mamografia, o autoexame e as consultas de rotina salvam milhares de vidas todos os anos. Ainda assim, muitas mulheres adiam esse cuidado. E quase nunca é por descuido. É por sobrecarga. Por estarem esgotadas de cuidar de todos, menos delas mesmas.
O peso invisível das mulheres fortes
A saúde mental feminina é um espelho do tempo em que vivemos. Desde cedo, as mulheres aprendem que precisam ser produtivas, agradáveis, eficientes e emocionalmente disponíveis. Aprendem que precisam sustentar a casa, a carreira e o sorriso. A mulher contemporânea foi ensinada a ser incansável e, nesse esforço, perdeu o direito de simplesmente existir sem provar nada a ninguém.
A consequência desse padrão é sutil, mas devastadora. Vem em forma de ansiedade, insônia, irritabilidade, crises de pânico e depressão.
A Organização Mundial da Saúde mostra que as mulheres têm o dobro de probabilidade de desenvolver depressão em comparação aos homens. E isso não é coincidência. É o resultado de uma sociedade que naturaliza a exaustão feminina e ainda chama de "rotina".
A depressão feminina raramente chega de forma escancarada. Ela aparece devagar, escondida em frases como "só estou cansada" ou "é só uma fase difícil". É o cansaço que não passa, mesmo depois do descanso. É a sensação de estar viva, mas sem energia de viver. O corpo manda sinais palpitações, dores, esquecimento, insônia , mas a mulher, acostumada a resistir, cala. Até que o corpo, em algum momento, fala por ela. E, às vezes, grita em forma de doença.
Quando o corpo adoece para dizer o que a mente não conseguiu
Corpo e mente não vivem separados. A psicossomática já nos ensinou isso há décadas: emoções reprimidas e estresse crônico mexem com o sistema imunológico, com os hormônios e com o equilíbrio de todo o organismo.
Mulheres submetidas a longos períodos de estresse mantêm altos níveis de cortisol e adrenalina. Esse estado constante de alerta gera inflamações, fadiga, alterações metabólicas e até vulnerabilidade imunológica. É como se o corpo dissesse, com sintomas, aquilo que a mente não conseguiu expressar.
O câncer de mama tem causas complexas, e não se pode reduzi-lo apenas a fatores emocionais. Mas ele nos lembra da importância de olhar para a vida de forma integral.
A prevenção não é só um ato médico; é um gesto de respeito consigo. É marcar o exame mesmo quando a agenda está cheia. É permitir o descanso sem culpa. É falar sobre medo e dor sem vergonha.
O toque que salva no corpo e na alma
Falar sobre Outubro Rosa é falar sobre cuidado em todas as dimensões. Não o autocuidado que virou moda nas redes sociais, feito de frases prontas e velas perfumadas, mas o autocuidado real: o que exige pausa, vulnerabilidade e presença.
O toque que previne o câncer é o mesmo que cura a alma.
A mamografia é uma forma de amor, e a terapia também é.
O autoexame salva vidas, mas o autoconhecimento salva existências inteiras.
O laço rosa é símbolo, mas precisa vir junto com outro tipo de laço: o laço com nós mesmas.
O convite do Outubro Rosa
Mais do que uma campanha, Outubro Rosa é um lembrete de vida.
É o momento de olhar para o corpo, mas também para o ritmo com que se vive.
É o convite para trocar a pressa por presença, a cobrança por compaixão, a força cega por autocuidado consciente.
Cuidar da mente é um ato de resistência.
Ir à terapia é tão essencial quanto ir ao ginecologista.
E descansar é um ato político num mundo que glorifica a produtividade até dentro da dor.
Que este Outubro Rosa seja mais do que uma data. Que seja um chamado à inteireza.
Que lembre que a verdadeira força está em se acolher, em reconhecer limites, em se permitir respirar.
Porque prevenir não é apenas detectar cedo uma doença.
É cultivar amor por si mesma todos os dias.
É viver de forma inteira corpo, mente e alma com a coragem de quem escolhe, a cada amanhecer, continuar florescendo.
Fonte: Terra.com | Autora: Jéssica Martani